Por Cristine Prestes
São Paulo
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A seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) divulga nesta quinta-feira (25/2) uma manifestação pública contra a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que alterou sua jurisprudência e passou a entender que a execução da pena imposta a condenados por crimes pode começar a ser cumprida após a condenação em segunda instância.
A “manifestação pública da Advocacia em defesa da Constituição e da Cidadania” será divulgada amanhã em encontro na sede da Ordem em São Paulo do qual participarão outras 13 entidades, como a Academia Paulista de Direito, a Associação dos Advogados de São Paulo (AASP), a Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas, o Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa) e o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), entre outras.
Segundo a OAB-SP, a mudança de orientação do Supremo para permitir que o cumprimento de sentença penal, com prisão do réu, ocorra antes do trânsito em julgado da decisão representa “um enorme retrocesso nas conquistas democráticas alcançadas com a Constituição Cidadã de 1988, pois relativiza cláusulas pétreas da presunção de inocência, do devido processo legal e da ampla defesa com os recursos a ela inerentes”.
Ainda segundo a nota divulgada pela OAB-SP, “se a decisão da Corte procurou ouvir a voz das ruas e dar resposta à lentidão do Judiciário, parece um despropósito mudar a letra constitucional sob um viés de cunho populista ou transferir para o cidadão o fardo da morosidade, que compete ao próprio Judiciário equacionar”.
De acordo com o presidente da OAB-SP, Marcos da Costa, o manifesto está sendo redigido em conjunto pelas entidades e deve fazer um alerta sobre a situação de insegurança jurídica gerada pela decisão do Supremo. “A decisão parece ser equivocada. É preciso discutir amplamente a situação do Poder Judiciário, e o palco para a discussão de questões relacionadas ao sistema de Justiça é o Congresso Nacional”, diz. Para Marcos da Costa, a decisão do STF dá a entender que todo mundo que tem condenação em segunda instância tem que ser preso, independentemente do caso concreto – se o crime é culposo ou se o réu é primário, por exemplo. “Vamos pedir para que o STF reconsidere a decisão”, afirma.
Decisão já provoca efeitos em processos penais
A decisão do Supremo que alterou a jurisprudência tem sido criticada pela advocacia, que entende que não cabe ao tribunal dar um novo entendimento à regra da Constituição que prevê que a execução da pena ocorrerá após o trânsito em julgado do processo penal – o que significa o esgotamento de todos os recursos possíveis. Durante o julgamento o Supremo não tratou da modulação dos efeitos da decisão – ou seja, não definiu se o novo entendimento pode ser aplicado para processos anteriores à nova decisão ou se valerá apenas para os processos julgados a partir da mudança da jurisprudência. Ainda assim, o Ministério Público já pediu, em alguns casos, a execução imediata da pena de condenados em segunda instância e alguns juízes também já determinaram prisões com base na nova decisão.
É o caso do juiz Adilson Paukoski Simoni, da 5ª Vara do Júri de São Paulo, que na segunda-feira determinou a prisão de Gil Grego Rugai, que recorria em liberdade da condenação pela morte de seu pai, Luiz Carlos Rugai, e de sua madrasta, Alessandra de Fátima Troitino. Ele foi condenado a 33 anos e 9 meses de reclusão, mas no ano passado foi libertado por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que permitiu que ele aguardasse em liberdade o julgamento de um recurso impetrado no Supremo. Ontem, o Ministério Público Federal em São Paulo também pediu ao STF o início da execução da pena de prisão imposta pelo Tribunal Região Federal (TRF) da 3ª Região ao ex-senador Luiz Estevão e ao ex-empresário Fábio Monteiro de Barros Filho, condenados pelo desvio de verbas públicas destinadas à construção do Fórum Trabalhista de São Paulo. Ambos foram condenados em 2006 a 31 anos de prisão por crime de peculato, corrupção ativa, estelionato, formação de quadrilha e uso de documento falso. O pedido foi encaminhado ao ministro Edson Fachin. Segundo o Ministério Público, Luiz Estevão ingressou com um total de 34 recursos nos tribunais superiores desde a confirmação de sua condenação pelo TRF. Dois dos crimes – formação de quadrilha e uso de documento falso – já prescreveram.
Impacto na Lava Jato deve ser imediato
Na Lava Jato, o impacto da decisão do Supremo deve ser imediato. Isso porque, desde meados do ano passado, a 8ª Turma do TRF da 4ª Região, responsável pelo julgamento dos recursos impetrados pelos réus condenados em primeira instância na Justiça Federal do Paraná, já adotada esse entendimento – ou seja, determinava a imediata execução da pena após confirmar as sentenças condenatórias. Com a decisão do STF, aumenta a chance de essas execuções serem mantidas pelos tribunais superiores diante de recursos dos réus. Embora a decisão do STF não seja vinculativa, ou seja, não obrigue todas as instâncias do Poder Judiciário a seguir o mesmo entendimento, a nova jurisprudência fixada pela Corte é um indicativo de que o STF manterá a execução imediata da pena determinada pela segunda instância quando os recursos contra as decisões subirem ao tribunal.
Até agora o TRF julgou três apelações de réus da Lava Jato condenados em primeira instância. Em todas, manteve as condenações de oito réus e determinou a imediata execução da pena. Na primeira instância já há 76 condenações, que devem ser julgadas pelo TRF ao longo dos próximos meses.
O ato da OAB-SP na sede da entidade (Rua Maria Paula, 35, 3º andar) às 13h30. Veja as entidades que participarão:
APD – Academia Paulista de Direito
APLJ – Academia Paulista de Letras Jurídicas
AASP – Associação dos Advogados de São Paulo
AATSP – Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo
ABRACRIM – Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas
CESA – Centro de Estudos das Sociedades de Advogados
IDDD – Instituto de Direito de Defesa do Direito
IAB – Instituto dos Advogados Brasileiros
IASP – Instituto dos Advogados de São Paulo
IBCJ – Instituto Brasileiro de Ciências Jurídicas
SASP – Sindicato dos Advogados de São Paulo
SINSA – Sindicato das Sociedades de Advogados dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro
MDA – Movimento de Defesa da Advocacia